Foi sem querer!
- E como você sabe que foi sem querer?
- Ela entrou correndo e esbarrou, foi sem
querer
- Ela não viu?
- Não, estava escuro.
-Como foi?
Ela chegou às pressas, ia correr na minha
frente para ir ao banheiro mas evitou quando percebeu que eu esticava o fio da
tomada para ligar o aspirador de pó. Perguntei aonde ela ia com tanta pressa e
ela começou a correr de novo dizendo para onde ia. Foi quando ela esticou o
braço, não viu o vaso e derrubou ele no chão.
- Qual vaso?
- O de ânfora em porcelana Romana
-VISH! Mais um desses, de novo? Quantas
vezes derrubaram de propósito esses vasos no chão, umas... 10?
-19!
-E você fez ela pagar também, não foi?
-Não!
- Como Não? Todas as vezes que alguém joga
um desses vasos no chão você faz a pessoa pagar o preço.
-É! E todas as vezes em que elas se
oferecem quebram algum deles de novo.
E o que você fez, por que você não disse
para ela pagar o seguro?
- Ela entrou correndo, não viu o vaso e
estava escuro. Além do que não se briga com uma pessoa por esbarrar num vaso
sem querer, mesmo que ele seja raro.
- E qual a diferença?
- A diferença é que ela cometeu um
acidente, entrou correndo, não viu o vaso. Já as outras pessoas veem os vasos,
sabem dos vasos, dizem ficar maravilhadas com os vasos e mesmo assim jogam no
chão de propósito quando acham que não tem valor.
- Então elas pegam o vaso nos braços, olham
nos seus olhos e soltam o vaso no chão de propósito. Sei, já me contaram essa
história antes. De como invadiram a sua casa e quebraram os vasos por acharem
eles sem valor comercial e como te bateram quando descobriram que você não
tinha muito dinheiro.
É verdade que a polícia quis te prender por
ter batido nos ladrões dizendo que era muito natural eles invadirem a casa das
pessoas, baterem nelas e que você era o único da vizinhança que reclamava
disso? É verdade que você teve que pedir desculpas publicamente para um dos
caras que te bateu?
-Sim! Tive que fazer isso e ainda lavar a
camiseta dele que sujei durante a briga, caso contrário a polícia disse que
assinaria uma advertência contra mim. Você não se lembra que o ladrão queria
uma camiseta nova?
- Sim! Eu me lembro! Mas você realmente tem
certeza de que ela...
- Eu já disse! Estava escuro, ela mal
conhece a minha casa, nunca viu o vaso. E além disso ela é distraída, dorme
pouco. Não ficaria surpreso se um dia ela passa-se na rua usando as calças do
pijama no lugar da calça jeans.
-Então você não ficou chateado?
Claro que eu fiquei, tive raiva na hora,
mas daí eu lembrei que ela não sabia das histórias, das inúmeras vezes em que
eu apanhei dos ladrões e a polícia não queria levar o caso adiante, por que eu
não tinha nada de valor que foi roubado, etc.
E o que você fez?
Bom, uma semana depois ela passou pela rua
novamente e eu disse o que tinha acontecido, que demorei para dizer que tinha
ficado chateado por causa das vezes que já quebraram os meus vasos, que precisava
separar ela das outras histórias, etc, etc.
-E como ela reagiu?
-No começo fiquei meio temeroso, ela não
estava muito bem, não a conheço muito bem, não sabia como ela iria reagir.
-Como assim, ela estava doente?
- Tinha pedra nos rins, nada que venha ao
caso comparado com as ameaças de advertência da polícia cada vez que alguém te
agride. Ela foi inteligente, pegou nas minhas mãos, olhou nos meus olhos e me
pediu desculpas, muito diferente dos outros policiais que vão logo apontando o
dedo na sua cara e usando da autoridade para se justificar.
-Ah! Ela é da polícia também é?
Sim! Polícia forense. Um dia eu passava
pela rua e ela me chamou para tomar um café. Fiquei desconfiado, mas como nem
sempre os forenses andam armados, resolvi arriscar. Uma semana depois que ela
foi até em casa, me deu um abraço e pediu desculpas de novo por ter me
chateado, derrubando o vaso.
- E o vaso?
- Quebrei o resto e joguei fora!
- Você jogou fora um vaso de de porcelana
Romana ?!!! Você é louco?
-Claro! Já estou cansado de todas as vezes
que invadiram a minha casa por causa desses vasos e eu tive que ligar para o
seguro ouvindo a polícia dizer que eu deveria esconder os vasos. Que, apesar de
eu ter sido agredido e blá! blá! blá! E que se eu não estivesse satisfeito com
a vizinhança que caísse fora. E Blá! Bla! Blá! E esse vaso era velho, todo
remendado. No fundo eu acho que ela até me fez um favor derrubando aquela
velharia dali.
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