Foi quando eu era criança, eu deveria ter
uns 6 pra 7 anos mais ou menos. Ela era psicopedagoga, (deve ser ainda) me
atendia na AACD e viva me perguntando do "por que" eu estar ali se
existiam outras pessoas na fila de espera com deficiências mais graves do que a
minha.
Certo dia a AACD colocou fonoaudiologia na
minha grade horária, minha mãe conversou com um fisiatra que me atendia uma vez
a cada 6 meses, de lá ele me encaminhou pra fono e como eu ainda estava ligado
a AACD e fazendo terapias, comecei o tratamento.
Minha mãe estava muito preocupada, eu já
tinha 7 anos, quase 8 e ainda não sabia ler nem escrever. Quando você é
deficiente, aluno de escola pública e você houve a sua professora dizer pras
colegas dela que ela tem uma pessoa com deficiência na sala dela, você para e pensa:
"fudeu”! Não sou um ser humano, sou uma pessoa, sou uma pessoa, e talvez
um aluno." As pessoas acham que
quando se é criança você é só uma criança de 7 anos que não quer nada da vida,
que só pensa em brincar, jogar bola, enfim coisas de criança. E quando você é deficiente? Bom, as pessoas
não acham nada, te chamam de deficiente e as vezes acrescentam pessoa no início
da frase só pra dizer: "Nossa como eu sou legal, aprendi que deficientes
também são pessoas!"
A psicopedagoga que ministrava a minha
terapia, quando viu eu e a minha mãe conversando no corredor com a fono, quase
teve uma crise de raiva. Dizia pra minha mãe que ali não era o meu lugar, que a
minha mãe tinha que procurar tratamento (psicólogo) e ver logo de uma vez que
eu não tinha deficiência alguma.
Em 8 meses a fono me ensinou a ler, eu só
fui me aprimorar bem na escrita depois que entrei pra escola particular como bolsista, lá se
escreve tanto que até redação sobre como a minha mãe escolheu meu nome eu fiz.
. Quando eu fiz a
transferência da escola pública pra particular eu senti que nem todos os meus
professores vinham "prontos" como um brinde no fundo da caixa de
cereais, alguns deles quiseram saber mais sobre min, sobre a AACD. No ensino privado tive muitas barreiras, tanto arquitetônicas quanto sociais, posso contar
nos dedos de uma só mão quantos professores eu tive na infância e que viam em
mim uma criança, um ser humano com potencial. Mas só de me chamarem de aluno e
criança, eu me sentia bem, eu não era só mais uma pessoa com deficiência, eu era
um ALUNO que tem uma deficiência. Eu não sei porque, mas eu só me senti João
Paulo quando eu entrei na escola de teatro. Na escola particular eu passei de
pessoa com deficiência, pra um aluno, que de vez em quando era chamado de
"Osasco" "cabeção" já no teatro é diferente, eu passei de
aluno pra JP, João Paulo, um cara que além de aluno, é ESTUDANTE.
E a deficiência? Às vezes, no teatro, os
meus colegas esquecem, os professores na faculdade se esquecem, e as vezes eu
também. Por um fato muito simples, me apaixonei tanto pelo que eu descobri
dentro de mim no teatro, que as minhas limitações não fazem de mim quem eu sou,
isso é apenas o meu corpo, e não eu. Não é preciso ser deficiente pra ser
atuante e vice-versa, a minha deficiência é algo físico que se deu por um fator
neurológico, mas a minha composição é a mesma de como qualquer outro ser
humano, e é aí que eu moro hoje, dentro dessa composição, num jardim cheio de
composições químicas e orgânicas que de vez em quando eu teimo em enfeitar. Meu
corpo é apenas uma casca que não consegue fazer coisas, isso não me interessa,
o que me interessa está dentro da casca, eu!
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